“Eu já estou
com o pé nessa estrada. Qualquer dia a gente se vê. Sei que nada será como antes, amanhã."
(Milton Nascimento e Ronaldo Bastos - Álbum “Clube da Esquina” - 1972)
(Milton Nascimento e Ronaldo Bastos - Álbum “Clube da Esquina” - 1972)
Qual a medida do tempo? O coração do
poeta transcrito nos versos acima entra em alvoroço, amanhã ou depois de amanhã. O pulsar dos caminheiros arde quando
percebem que, há pouco, o Amor estava
entre eles e nem sequer perceberam. Os sonhos da mocidade os move para um futuro melhor.
Na tradição judaica, o presente está
intimamente ligado com o passado. Como poderíamos definir o presente puramente,
se enquanto eu escrevo estas palavras e vocês lêem, isto já virou passado? O
tempo presente, para os judeus, só Deus pode viver, como respondeu para Moisés:
“Eu sou o que sou”(Ex 3,14), e não “Eu era o que eu era”, por exemplo. Deus
acontece, está em curso.
Os filmes, por outro lado, nos
apresentam histórias com começo, meio e fim. É certo que em alguma hora do
filme todos os personagens serão apresentados. Logo depois alguma tensão
surgirá, um conflito que só será resolvido no final do filme. Essa linearidade
cinematográfica, na vida, chamamos de Chronos, em latim, tempo cronológico.
Falta de tempo: uma das angústias do homem moderno |
Para melhor entendermos, o mundo
grego apresentava o deus pagão também chamado de Chronos, que devorava os seus, assim como o tempo
nos devora! Engraçado é pensar sobre a falta de tempo que nos consome nos dias
de hoje, o tempo de parar, o tempo de ser.
“O tempo perguntou para o tempo quanto tempo o
tempo tinha. O tempo respondeu para o tempo que tinha tanto tempo quanto tempo
o tempo tinha!”
(Prof. Carlos Martendal - Programa “Palavra
Viva” - janeiro de 2014)
A liquidez de um tempo que parece
escorrer na palma de nossas mãos não nos permite sentir o sagrado, o eterno que
a vida nos dá. Até conseguimos viver baseados no Chronos de nossas vidas: ligados no “automático” de
segunda a sexta, e pensando no sábado. Acontece que a vida também acontece de
segunda a sexta. O melhor da festa é viver sua preparação.
Através da figura de Cristo, o tempo
ganha novo significado. Não nos contentamos com o Chronos, é muito pouco para nós! Deus vem nos dar o Kairós, um
tempo presente diferente: o tempo de Deus, o tempo da graça.
Certo amigo me confidenciou a graça
de poder retornar a terra natal, como se o tempo parasse naquele instante tão
especial. Pouquíssimos dias para um agitado ano, mas com ares de sacralidade.
Inexplicáveis tempos de eternidade. Como se sentíssemos um gostinho do que há
por vir quando Ele nos chamar.
Kairós: a lógica do tempo se esvai e permanece a graça |
Assim se dá o Kairós.
Curioso: temos que nos permitir ter tempo para poder sentir este tempo de
graça. Com “o copo totalmente cheio” dos afazeres, preocupações e correrias
talvez não o percebamos.
Qual a última vez que vivemos um
tempo sagrado, seja por um minuto, por um dia, por um momento? Isso aconteceria
com mais freqüência se aprendêssemos a ter este olhar para as coisas simples da
vida?
Um querido casal contou a fantástica
história de viverem o Kairós em um simples jantar. O motivo? A bateria do
celular de ambos havia terminado. Olhos nos olhos! Quantos frutos colheram
neste inesquecível tempo que tiveram para si.
O crescimento pessoal não tem que, necessariamente, seguir uma linha
reta, definida. Não nos contentemos com o Chronos que o mundo nos sugere, onde os primeiros
cabelos brancos vão surgindo a partir do stress que permitimos adentrar.
Procuremos o Kairós.
Pois quem O procura, O encontra.
Nos recomenda um querido Sacerdote:
“Nós complicamos demais a vida, e por esse
motivo sofremos tanto. Deus é simples. Prefere os caminhos inusitados. Olhe ao
seu redor. Veja o que é pequeno e humano. Ele costuma se esconder nestes
lugares..."
(Pe. Fábio de Melo - Livro “Quando o
Sofrimento Bater em Sua Porta”)
Deus quer participar de nossa vida,
em dias nebulosos e também quando o sol estiver brilhando forte na ciranda de
nossas vidas. Tudo é graça, Deus nos conduz. Depende de nós.
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