terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Porque Tu nos deste o existir

A estrada os levava, pai e filho, por mais uma dessas sacralidades que a vida faz questão de mostrar. A quietude não habitual de ambos flagrava um sentimento que não escolhemos sentir: a saudade.

A criança, com pouco menos de três anos de vida começava a dizer suas primeiras palavras e discernir algumas questões que até então eram imperceptíveis em sua vida. O be-a-bá da vida ia se desenrolando com uma graça inefável, em um corpo miúdo que haveria de crescer com o passar do tempo. O pai, saudoso guardião da família, ao ligar o carro após botar a criança cuidadosamente na cadeirinha se sentia curiosamente engraçado.

O amor nos obriga a fazer coisas engraçadas! Ele nos faz lembrar só por lembrar, dar risada sozinho, se derramar em lágrimas. E a memória ajuda a não olvidar a vida que foi vivida. O pai, enquanto dirigia, lembrava-se da primeira vez que fora buscar a amada, “lembro como se fosse ontem...” costumava dizer.  

Tantos anos haviam passado mas a sensação era a mesma. Naquela manhã ensolarada, como Exuperry, sabendo que a esposa chegaria de viagem as nove horas, desde as sete se alegrou. E como!

O pequeno nunca havia passado pela experiência de estar tanto tempo longe da mãe. Apenas alguns dias para nós adultos, uma vida inteira para a criança, que, através de sua inteligência, fazia questão de dormir na cama da mãe durante sua ausência, como que quem não podia se deixar esquecer daquela que deu a luz à ele.

Chegando no aeroporto o menino, no colo do pai, aos poucos fazia a percepção de que veria novamente a sua genitora pois, se não estava enganado, aquele era o último lugar que a tinha visto. Tanta gente! Tanta pressa! Nós temos pressa, mas é preciso aprender que às vezes o tempo corta nosso peito como faca e deixa a marca pra sempre. É preciso parar. Viver a essência, sentir a vida.

Através da janela do aeroporto, o pai instruía o filho e explicava o que estava acontecendo. Sim, mamãe estaria, naquele estranho objeto barulhento. E sim, através da indicação do pai o menino a enxergava pela janela. Gritava de felicidade! Mas a mãe sumiu. No Hercílio Luz sabemos que avistamos as pessoas amadas na parte de cima e vamos tornar a vê-las somente no andar de baixo. Para o menino a mãe havia ido embora novamente. E abriu um berreiro!

Crescer nunca é fácil, você se apega as coisas que já é, você se pergunta o que é que ainda está por vir. Mal sabia o menino que haveria de passar por tantas decepções quanto essa! O pai tentava consolá-lo, mas não adiantava. Como Thomé só acreditava vendo. E nada o faria mudar de idéia.

A experiência do cuidado vindo do pai também haveria de passar por diversas e diferentes experiências. A vida não anda pra trás, não espera por ontem. Em um piscar de olhos o pai envelheceria e o filho, com a perna no mundo, sairia por aí, vida afora.

Filhos vão embora, e pais ficam para trás. Porém o movimento de eterno não permite que o tempo e a distância signifiquem alguma coisa. O pai reconhece no filho os sonhos que ainda vai sonhar.

Finalmente, chegando no desembarque, a porta automática se abre e ela reaparece. O coração dos dois batendo forte, e uma felicidade dessas que nem um livro conseguiria explicar. O choro do menino cessara e o tempo fez questão de secar suas lágrimas.

Estavam completos de novo, os três. Os três que eram um. E seguiram para casa, a criança dormindo no colo da mãe, e o casal como eternos namorados: com corações que aprenderam a amar e serem amados.
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Amigos, notemos que no simples conto acima o nome de Deus não foi citado. Não lemos sobre Cristo, ou sobre a força do Santo Espírito. Não foi preciso.

Como um eterno apaixonado, Ele se mostra nos detalhes. Imagino o Senhor, de sua plenitude, se emocionando com o pai que relembra do começo de seu namoro como se fosse ontem.Vislumbro Ele acalmando o coração da mãe, que em viagem fez a difícil experiência do separar-se momentaneamente dos que amava. Vejo Ele, enfim, sorrindo quando os três se encontram novamente. Esse é o Deus em que botamos a nossa confiança, o Senhor da Vida.

Obrigado meu Pai, porque respiramos, estamos vivos, temos saúde!

Obrigado meu Deus, pela nossa família, pelo nosso sofrimento, pela nossa alegria!

Obrigado Senhor, porque Tu nos deste o existir! 

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