A estrada os levava,
pai e filho, por mais uma dessas sacralidades que a vida faz questão de
mostrar. A quietude não habitual de ambos flagrava um sentimento que não
escolhemos sentir: a saudade.
A criança, com pouco
menos de três anos de vida começava a dizer suas primeiras palavras e discernir
algumas questões que até então eram imperceptíveis em sua vida. O be-a-bá da
vida ia se desenrolando com uma graça inefável, em um corpo miúdo que haveria
de crescer com o passar do tempo. O pai, saudoso guardião da família, ao ligar
o carro após botar a criança cuidadosamente na cadeirinha se sentia
curiosamente engraçado.
O amor nos obriga a
fazer coisas engraçadas! Ele nos faz lembrar só por lembrar, dar risada sozinho,
se derramar em lágrimas. E a memória ajuda a não olvidar a vida que foi vivida.
O pai, enquanto dirigia, lembrava-se da primeira vez que fora buscar a amada, “lembro como se fosse ontem...”
costumava dizer.
Tantos anos haviam
passado mas a sensação era a mesma. Naquela manhã ensolarada, como Exuperry,
sabendo que a esposa chegaria de viagem as nove horas, desde as sete se
alegrou. E como!
O pequeno nunca havia
passado pela experiência de estar tanto tempo longe da mãe. Apenas alguns dias
para nós adultos, uma vida inteira para a criança, que, através de sua
inteligência, fazia questão de dormir na cama da mãe durante sua ausência, como
que quem não podia se deixar esquecer daquela que deu a luz à ele.
Chegando no aeroporto o
menino, no colo do pai, aos poucos fazia a percepção de que veria novamente a
sua genitora pois, se não estava enganado, aquele era o último lugar que a
tinha visto. Tanta gente! Tanta pressa! Nós temos pressa, mas é preciso
aprender que às vezes o tempo corta nosso peito como faca e deixa a marca pra
sempre. É preciso parar. Viver a essência, sentir a vida.
Através da janela do
aeroporto, o pai instruía o filho e explicava o que estava acontecendo. Sim,
mamãe estaria, naquele estranho objeto barulhento. E sim, através da indicação
do pai o menino a enxergava pela janela. Gritava de felicidade! Mas a mãe
sumiu. No Hercílio Luz sabemos que avistamos as pessoas amadas na parte de cima
e vamos tornar a vê-las somente no andar de baixo. Para o menino a mãe havia
ido embora novamente. E abriu um berreiro!
Crescer nunca é fácil, você
se apega as coisas que já é, você se pergunta o que é que ainda está por vir.
Mal sabia o menino que haveria de passar por tantas decepções quanto essa! O
pai tentava consolá-lo, mas não adiantava. Como Thomé só acreditava vendo. E
nada o faria mudar de idéia.
A experiência do
cuidado vindo do pai também haveria de passar por diversas e diferentes experiências.
A vida não anda pra trás, não espera por ontem. Em um piscar de olhos o pai
envelheceria e o filho, com a perna no mundo, sairia por aí, vida afora.
Filhos vão embora, e
pais ficam para trás. Porém o movimento de eterno não permite que o tempo e a
distância signifiquem alguma coisa. O pai reconhece no filho os sonhos que
ainda vai sonhar.
Finalmente, chegando no
desembarque, a porta automática se abre e ela reaparece. O coração dos dois
batendo forte, e uma felicidade dessas que nem um livro conseguiria explicar. O
choro do menino cessara e o tempo fez questão de secar suas lágrimas.
Estavam completos de
novo, os três. Os três que eram um. E seguiram para casa, a criança dormindo no
colo da mãe, e o casal como eternos namorados: com corações que aprenderam a
amar e serem amados.
-=-=-=-=-=-=-=-=-=-=-=-=-=-=-=-=-=-
Amigos, notemos que no
simples conto acima o nome de Deus não foi citado. Não lemos sobre Cristo, ou
sobre a força do Santo Espírito. Não foi preciso.
Como um eterno
apaixonado, Ele se mostra nos detalhes. Imagino o Senhor, de sua plenitude, se
emocionando com o pai que relembra do começo de seu namoro como se fosse ontem.Vislumbro
Ele acalmando o coração da mãe, que em viagem fez a difícil experiência do
separar-se momentaneamente dos que amava. Vejo Ele, enfim, sorrindo quando os três
se encontram novamente. Esse é o Deus em que botamos a nossa confiança, o
Senhor da Vida.
Obrigado meu Pai, porque
respiramos, estamos vivos, temos saúde!
Obrigado meu Deus, pela
nossa família, pelo nosso sofrimento, pela nossa alegria!
Obrigado Senhor, porque Tu nos deste o existir!
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