domingo, 10 de maio de 2015

A Cruz: Fragilidade e Vitória

             Quando era criança, me perguntava: por que a cruz? Por que utilizamos este simbolismo mórbido como identificação cristã? Não faria mais sentido a figura de um Cristo ressuscitado, um Vencedor, portanto?

             Hoje interpreto a simbologia que há por trás da cruz de uma forma diferente. Acredito que não poderia ser melhor.

A Santa Cruz
            Imagino o perigo e a frustração que conhecer somente o Cristo Ressuscitado poderia nos trazer. “Ele venceu. Eu com meus problemas, dificuldades e sofrimentos não. Portanto serei como um discípulo de Emaús no caminho de ida: um frustrado.”

            Tomás de Kempis, em Imitação de Cristo nos dá uma obra prima de psicologia. Mas pensando a fundo, é impossível imitar a Cristo pois somos outras pessoas e temos outras identidades. Temos nossas manias, nossos pecados, nossas preferências. Somos originais até nos erros. Temos que ser perfeitos como o Pai é perfeito, sim. No amor!

            O psicólogo Jung, em “Resposta a Jó” escreveu: “Não imite Jesus. Faça o que ele fez em você”. Dentro de nossa condição a Palavra de Deus se encarna. Se permitirmos, dentro de nossa vivência ordinária, Ele ali estará. Do nascer ao por do sol. Dia após dia, hora após hora. Um Deus incansável.

Depois do dia que Deus olhou nos olhos dos homens, através da Encarnação, ele nunca mais conseguiu viver sem os homens. O mistério da Encarnação está em nós. “Emanuel”, Deus está conosco.

“Se Deus tem planos para contigo, nunca mais terás descanso”
            
            Vemos na cruz dois traços. Um horizontal e um vertical. O traço que nos lembra que não estamos isentos de nossas limitações humanas, e outro que nos recorda a busca pelas coisas do Alto. Esperança e dor. Força e fraqueza. Fragilidade e vitória.

            No traço horizontal lembramos a fragilidade que não pode ser negada. Os sofrimentos de nossa história. As saudades.

            Posso ver a praia. Dia nublado. Um homem desolado vivendo por viver, sem perspectivas. Ele mesmo, Pedro. Bastou o galo cantar para que compreendesse quão limitado era. Culpa. Vergonha. Muito humano este sujeito.

            Lembro de um amigo que perdi há três anos. O melhor amigo que alguém poderia pedir e ter. Insubstituível, figura única. Mesmo assim não me sinto menos cristão por assumir saudades. A reflexão tem espaço importante em nossa história, pois ela é responsável por nossas superações.

            Superações estas que identificamos no traço vertical da cruz. O infinito. Somente pela fé cantamos: “Vitória, tu reinarás. Ó Cruz tu nos salvarás”. Há esperança no ar. 

            Pensemos no Céu, com carinho. Pela morte de Cristo, a própria morte viu o fim. Cremos no Ressuscitado.

            Quem imaginaria o que aconteceria com o mesmo Pedro depois? A Misericórdia de Deus impressiona pela gratuidade.

A busca das coisas do Alto
            A vida é dialética! Nem só de altos vivemos. E nem só de baixos. O poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto simplifica:

“Quadro nenhum está acabado,
disse certo pintor;
se pode sem fim continuá-lo,
primeiro, ao além de outro quadro
que, feito a partir de tal forma,
tem na tela, oculta, uma porta
que dá a um corredor
que leva a outra e a muitas outras.”
           
Não estamos acabados. Aguardemos o amanhã. Que tenhamos tempos verticalizados, apesar de entendermos e respeitarmos os traços horizontais do viver.

            Ao fazermos o sinal da cruz, com apoio da Santíssima Trindade, tentemos seguir vencendo com humildade e perdendo do jeito certo, sempre.

Um comentário: